A intensificação agrícola, com a possibilidade de cultivo de mais de uma cultura agrícola destinada a produção de alimentos, é uma prática consolidada hoje na agricultura do Brasil, com grande contribuição para a redução na pressão por abertura de novas áreas de vegetação nativa, sem prejuízo ao crescimento da produção agrícola nacional de grãos, fibras e energia. Contudo, em função da necessidade de crescimento da produção nacional de grãos, as possibilidades de rotação de culturas, através da diversificação de espécies vegetais nas lavouras, vem se reduzindo ao longo das últimas décadas.
É fato que os sistemas de produção intensificados, sobretudo os de produção de grãos e fibras do Cerrado no Brasil, possibilitaram alcançar os patamares de produção nacional atuais. Um exemplo do sucesso do aproveitamento das áreas de cultivo com mais de um ciclo de culturas é o da produção de milho, que registrou na safra 2021/2022 uma produção de 113,27 milhões de toneladas (CONAB, 2022), dos quais 86,12 milhões de toneladas (76%) foram oriundos da produção de milho 2ª safra (milho safrinha). Somente este percentual de milho adicional produzido na segunda safra, se considerada a produtividade média nacional de milho 1ª safra, safra 2021/22, de 5.499 kg ha-1 (CONAB, 2022), representou uma economia na necessidade de áreas de cultivo na ordem de 15,661 milhões de hectares adicionais para garantir a mesma produção de milho, podendo este ser citado como um impacto positivo direto para a preservação de áreas nativas, ou ainda na redução da pressão para conversão de outros usos agropecuários à produção de grãos no Brasil.
Contudo, as áreas agrícolas em sucessão de culturas apresentam baixa diversidade vegetal, e esta ausência de rotação de culturas resulta em impactos na conservação dos solos. Neste artigo, iremos falar sobre rotação de culturas e suas características. Boa leitura!
O que é a rotação de culturas?
A rotação de culturas é uma prática de manejo agrícola dos solos que consiste em sistematicamente alternar de forma planejada as espécies de culturas a serem cultivadas ao longo do tempo. A rotação de culturas tem por finalidade promover a diversidade de espécies vegetais na lavoura, propiciando uma série de benefícios ao solo, tanto em aspectos físicos, como químicos e biológicos, além de contribuir substancialmente na redução da pressão de pragas e doenças, podendo ainda contribuir para a redução da ocorrência e da intensidade e da ocorrência de plantas daninhas.
Qual a diferença entre rotação e sucessão de culturas?
Enquanto a sucessão de culturas se baseia no cultivo de uma ou duas espécies vegetais cultivadas em sequência em uma área agrícola, com repetições dos ciclos ao longo dos anos subsequentes, a rotação de culturas, embora possa incluir as mesmas espécies de cultivo comercial, busca alterná-las no espaço e no tempo com outros cultivos, sejam eles com a finalidade de produção comercial, ou ainda cultivos que visam a produção de biomassa e/ou ciclagem de nutrientes, proporcionando também acréscimos na qualidade física do solo, com diferentes sistemas radiculares e volume de solo explorado, além de incrementos na qualidade biológica, como a maior diversidade de microrganismos induzida por diferentes exsudatos radiculares oriundos das diferentes espécies vegetais introduzidas, reduzindo-se também a ocorrência de microrganismos oportunistas, entre eles os nematoides e microrganismos fitopatogênicos.
A sucessão de culturas pode resultar em diminuição da produtividade das culturas comerciais cultivadas numa área agrícola, geralmente resultante da pressão de exaustão da qualidade física, química e biológica do solo, sendo também reflexos desta degradação o favorecimento para a ocorrência com maior frequência de pragas e doenças, além do surgimento de plantas daninhas.
Entre os sistemas de sucessão mais comuns no Brasil estão o sistema soja-milho, o principal sistema de sucessão de culturas no país. São ainda sistemas de sucessão de ocorrência no país o sistema soja-trigo, soja-algodão, e mais recentemente e em crescimento, sobretudo em função de restrições climáticas ao cultivo do milho 2ª safra em algumas regiões do Cerrado, os sistemas de sucessão soja-sorgo, soja-milheto ou ainda soja-braquiária. Todos estes sistemas de sucessão, embora contribuam para a intensificação da produção de grãos e fibras, são sistemas de baixa diversificação vegetal, contribuindo para a degradação química, física e biológica dos solos. Não obstante, ainda é grande a adoção do sistema de produção de grãos seguido do pousio, sendo este monocultivo adotado em áreas com sistema de distribuição pluviométrica bimodal com maior tempo de restrição de chuvas no outono-inverno, porém sem os devidos cuidados com a conservação do solo, em muitos casos.
Quais as vantagens e os benefícios da rotação de culturas?
A adoção da rotação de culturas resulta em diversas vantagens, tanto para a qualidade do solo, quando na sustentabilidade das áreas agrícolas para a produção das culturas comerciais. Quando bem estruturada, a rotação de cultura adotando plantas de diferentes sistemas radiculares incrementa na qualidade do solo, tanto em aspectos físicos, como em atributos físicos e biológicos.
Com relação às características físicas do solo, espécies utilizadas em rotação resultam em diferentes explorações do solo e em graus distintos de exploração radicular, o que resulta em maior porosidade, melhorando a aeração do solo, além de contribuir substancialmente para a redução da ocorrência de compactação no solo e ainda aumentar a infiltração e retenção de água no perfil do solo.
A compactação é reconhecida como a principal causa de degradação da qualidade física do solo, com incremento na densidade e resistência mecânica do solo, além de reduzir a porosidade do solo e a macroporosidade, a capacidade de infiltração de água, a aeração e a condutividade hidráulica. Todas estas modificações diminuem a disponibilidade de água e oxigênio no solo, limitando o crescimento radicular das plantas, resultando em redução da produtividade das culturas, especialmente sob condições de excesso ou deficiência hídrica (Torres & Saraiva, 1999).
A importância da rotação de culturas para o controle da compactação do solo sob sistema de plantio direto (SPD) foi avaliada por Franchini et al. (2011) através da resistência do solo à penetração (RP). Após 22 anos de SPD, a RP na camada superficial do solo (0 a 20 cm) foi menor quando adotada a rotação de culturas, em comparação ao pousio (Figura 1).
Na sucessão de culturas, a RP na camada de 10 a 20 cm chegou a 6 a 7 MPa, sendo estes valores considerados elevados e com potencial de restringir o crescimento radicular da cultura da soja (SARAIVA, 1999). Em condições de alta compactação e resistência a penetração, o acesso das raízes da soja ao perfil de armazenamento de água no solo se reduz, tornando a cultura vulnerável a perdas de produtividade em condições de períodos de seca.
Qualidade química do solo
Em relação a qualidade química do solo, a rotação de culturas é benéfica para a ciclagem de macronutrientes e micronutrientes, o que contribui para a melhoria da fertilidade do solo. Ainda, a produção de biomassa e diversificação de sistemas radiculares contribui para o aumento dos estoques de carbono no solo, resultando em elevação da matéria orgânica do solo, da capacidade de retenção de nutrientes e, em última instância, do melhor aproveitamento de macro e micronutrientes e da eficiência de insumos corretivos, condicionadores e fertilizantes. Franchini et al. (2011) demonstraram aumento na eficiência de uso de fósforo quando da adoção da rotação de culturas (tremoço/milho, aveia/soja, trigo/soja, trigo/soja), com recuperação do nutriente aplicado chegando a 67%, superior ao índice de recuperação de fósforo encontrado no sistema de sucessão contínuo de soja/trigo (50% de recuperação de fósforo).
A utilização da rotação de culturas ainda contribui para a biologia do solo, sobretudo para a diversidade de microrganismos no solo. Esta diversificação, por sua vez, é benéfica para as lavouras comerciais, com redução da ocorrência e da intensidade e severidade de microrganismos de solo oportunistas, como fungos fitopatogênicos e os nematóides.
Áreas com histórico de rotação de culturas apresentam redução da pressão por pragas e doenças nas lavouras, com a quebra do ciclo de vida de organismos patogênicos e redução das populações de muitas pragas recorrentes em lavouras comerciais. O uso da terra diversificado ainda proporciona redução no fluxo de emergência de plantas daninhas, especialmente em cultivos de plantas que apresentam alta produção de produção de biomassa e de palhada na superfície, a qual servirá de cobertura ao solo durante o cultivo subsequente, reduzindo a germinação de espécies de plantas daninhas fotoblásticas positivas, dentre elas uma das principais mencionadas nas lavouras de soja do Brasil, a Buva (Conyza spp.).
Algumas culturas, como as espécies de crotalaria, possuem a capacidade de reduzir a taxa de reprodução de pragas de solo como nematoides fitopatogênicos, sendo, portanto, utilizadas como ferramenta adicional de manejo para o controle desta praga nas lavouras. Outro exemplo está a adoção do cultivo de culturas como o nabo forrageiro e o cultivo de braquiária (solteira ou em sistemas de consórcio), com a finalidade de utilizar estas plantas para ciclar marcro e micronutrientes do perfil do solo, uma vez que apresentam grande potencial de crescimento do sistema radicular, absorvendo assim nutrientes de camadas mais profundas do solo e acumulando em sua biomassa, a qual ficará disponível na forma de palhada para culturas subsequentes.
Em última instância, a rotação de culturas constitui-se em prática fundamental para aumentar a eficiência econômica e agronômica dos sistemas de produção, oferecendo proteção ao solo contra a ação de intempéries climáticas, além de aumentar a estabilidade da produção e a produtividade das culturas.
Quais as desvantagens da rotação de culturas?
A principal desvantagem e que em alguns casos consitui-se em barreira para a adoção de sistemas de rotação de cultivos está relacionada com o adequado planejamento que contemple a diversificação de espécies na área agrícola no tempo, com o mínimo impacto no cultivo de culturas comerciais.
Em algumas regiões do país, especialmente no Cerrado, ainda são poucas as espécies cultivadas que permitem ao mesmo tempo diversificação na produção de biomassa de parte aérea e de raízes, com a possibilidade de colheita da produção, sem impactos na receita anual da propriedade. Não obstante ainda perduram os principais sistemas de sucessão de culturas: soja + milho safrinha ou ainda, em propriedades com adoção de tecnologia e maquinário para o cultivo de algodão, persiste a suscessão soja+algodão 2ª safra. Alternativamente, podem ser encontradas a sucessão soja/sorgo, soja/milheto, soja/braquiária, podendo esta também ser utilizada com sucesso em sistema de consórcio com milho safrinha, agregando em diversidade e geração de receita na propriedade rural.
Outro ponto limitante para a adoção de rotação de culturas está relacionado às necessidade adicionais de maquinário e práticas mecânicas, quer seja para o manejo da palhada resultante do cultivo de espécies destinadas a produção de biomassa, ou ainda a equipamentos para semeadura de espécies de cobertura. Adiciona-se a este ponto ainda as necessidades de crédito adicional, tanto para aquisição/adequação de maquinários, quanto para aquisição de insumos e sementes de plantas para rotação de culturas que eventualmente não apresentariam capacidade de geração direta de receita, como por exemplo o caso das plantas de cobertura.
Contudo, cabe ressaltar que os benefícios gerados pela rotação na sustentabilidade da produção das áreas agrícolas, com consequente aumento de produtividade das culturas comerciais, frequentemente resulta em retorno sobre os investimentos nos cultivos inseridos no sistema de rotação com a finalidade de produção de biomassa e ciclagem de nutrientes na lavoura.
Quais são as características da rotação de culturas e como manejar os sistemas de rotação?
Para o adequado planejamento da rotação de culturas em uma área agrícola, alguns critérios devem ser considerados, sobretudo para a seleção das espécies cultiváveis que irão compor o sistema de rotação de culturas.
Entre os principais critérios para a adoção de espécies vegetais e a definição do sistema de rotação de culturas a adotar estão:
1. As espécies vegetais a compor o sistema de rotação idealmente não devem ser sequencialmente suscedidas por outras da mesma família botânica;
2. As caractrerísticas climáticas e a aptidão agrícola da área é o principal fator determinante para a escolha de espécies a cultivar, devendo ser observado o zoneamento climático da região e a adaptação das culturas a adotar, em função das características edafoclimáticas locais;
3. A alternância de sistemas radiculares é benéfica para a melhoria da qualidade física, química e biológica do solo. Desta forma, a utilização escalonada de espécies de sistema radicular profundo com espécies vegetais de sistema radicular fasciculado é benéfica. Contudo, os maiores benefícios a se considerar das espécies para o planejamento de rotação de culturas estão relacionados a capacidade das plantas em produzir fitomassa suficiente para promover a cobertura do solo que permita minimizar os processos erosivos, diminuir as oscilações de temperatura do solo e aumentar a eficiência do uso da água no sistema;
4. Idealmente culturas que apresentam grande acúmulo e exportação de macro e micronutrientes podem ser rotacionadas com espécies com baixa exportação e grande potencial de ciclagem de nutrientes, podendo também à lista de espécies para o planejamento de rotação o uso de leguminosas, as quais irão também adicionar nitrogênio ao solo, através da fixação biológica;
5. A susceptibilidade a pragas e doenças das culturas deve ser considerada para o planejamento de rotação de culturas, bem como a capacidade das espécies em agir como hospedeiras alternativas para pragas e doenças, dando preferência para alternância entre espécies resistentes e supressoras entre a adoção de espécies com baixa tolerância às pragas e doenças com ocorrência detectada na área agrícola;
6. O manejo de plantas daninhas também deve ser observado no planejamento de rotação de culturas, evitando intercalar espécies que apresentam dificuldade para controle de crescimento espontâneo no cultivo subsequente;
7. A seleção de espécies a cultivar deve também levar em conta a sua adaptabilidade dentro do sistema de produção comercial da propriedade, levando-se em conta as possibilidades do produtor para a adoção da rotação considerando suas necessidades de produção comercial;
8. Outros aspectos a considerar envolvem a disponibilidade de maquinário adequado para cultivo e manejo das espécies a cultivar, as condições financeiras da propriedade, as demandas de mercado para o cultivo das culturas comerciais e os custos de produção e expectativas de rentabilidade.
A seleção de espécies para rotação de culturas deve basear-se na diversidade botânica disponível de plantas cultivadas, de acordo com as condições edafoclimáticas locais. Plantas com diferentes sistemas radiculares, hábitos de crescimento e exigências nutricionais podem ter efeito na interrupção dos ciclos de pragas e doenças, na redução de custos e no aumento do rendimento da cultura principal (soja). As principais opções são milho, sorgo, milheto (principal espécie cultivada em sucessão: safrinha) e, em menor escala, o girassol.
A escolha do melhor sistema de rotação de culturas deve levar em conta o próprio objetivo do sistema. Quando este está em produzir cobertura ao solo ou fornecer palha adicional ao sistema, deve-se optar por espécies e cultivares que produzam quantidades elevadas de massa seca de relação Carbono/Nitrogênio elevada e que permitam manejo que retarde a decomposição. Deve-se considerar também o custo das sementes e o possível retorno financeiro na comercialização dos grãos.
O uso da rotação de culturas permite a diversificação de operações nas propriedades, tanto em sistemas que rotacionam culturam anuais, como: soja, milho, arroz, sorgo, milheto, algodão, feijão, girassol, trigo, ou mesmo com a inserção de plantas de cobertura ou pastagens. O esquema de rotação deve permitir variações entre as culturas envolvidas, pois além dos benefícios advindos dos aspectos técnicos, os aspectos econômicos também são muito importantes, já que influenciam e podem variar num curto espaço de tempo.
Cabe ressaltar que o planejamento da propriedade a médio e longo prazo é necessário para que a implementação seja implementada sem exaurir as atividades operacionais de rotina da propriedade, além de ter o planejamento bem definido quanto a viabilidade econômica. Nesse planejamento, também é preciso considerar todas as demais tecnologias à sua disposição, entre as quais destacam-se: técnicas específicas para o controle de erosão, qualidade e tratamento de sementes, época e densidade de semeadura, cultivares adaptadas, controle de plantas daninhas, pragas e doenças, além de práticas de calagem e adubação, as quais podem contribuir para o aumento da produtividade das culturas e da produção de biomassa, gerando mais palhada e maior desenvolvimento de raízes ao solo.
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